quarta-feira, 9 de março de 2011

Cinquent’anos

MOURA NETO

Aos cinquent’anos, hermanos, será que ainda mergulhamos afoitos no mar da imprudência? Será que ainda queremos subverter a ordem das coisas, testar nossos limites, romper fronteiras e explorar caminhos ainda não trilhados pelos nossos iguais?

Será que ainda somos capazes de embarcar nas viagens psicodélicas do rock progressivo de Pink Floyd? Navegar na voz estridente de Janis Joplin ou na melodia chorosa de Billie Holiday com a mesma voragem dos infantes que já fomos?

Aos cinquent’anos, hermanos, será que já conseguimos nos libertar da nostalgia entorpecente que nos aprisiona os sentidos quando nos voltamos para os dias fulgurantes de outrora? As tertúlias subversivas no 307 do Wimbledon? O alucinante chá das 5 no Verso e Prosa? As noitadas inconseqüentes no Boca Bar?

Será que ainda temos fôlego para refazer a trilha inca até Machu Picchu? Ou penetrar na floresta para celebrar a vida com os xamãs? Ou ainda, quem sabe, concretizar o tão sonhado projeto do caminho de Compostela? Ou se aventurar no silêncio abismal dos redutos dos monges budistas no Himalaia?

Aos cinquent’anos, hermanos, será que ainda temos a inocência dos que sofrem por amor, dos que se atiram como suicidas às paixões exacerbadas e dos que encontram poesia na banalidade do cotidiano: o cão que ladra, a criança que aprende a andar de bicicleta, o carteiro que confere endereços para entregar a correspondência?

Será que já temos maturidade profissional para escrever o livro que jaz em anotações intermináveis? Será que ainda uma vez mais retornaremos aos pampas para tomar chimarrão nas pracinhas sob o sol ameno do inverno gaúcho? Será que voltaremos a nos encontrar no planalto para trocar confidências sobre os habitantes da antiga aldeia? Será que ainda nos embriagaremos com a alma feminina com um dia nos embriagou Dorothy Lamour?

Aos cinquent’anos, hermanos, será que não chegamos à idade da razão? Não será chegada a hora de investigar nossos pensamentos mais secretos para descobrimos o novo ser que nos habita e que anseia em se apresentar na plenitude da nossa consciência?

Será que já não domamos nossos instintos selvagens e rebeldes e da convivência que tivemos conosco mesmo podemos extrair lições para os nossos descendentes? Será que já não é possível olhar para as rugas que teimam em nos afrontar o rosto e sentir que valeu a pena viver tudo o que foi vivido, todas as alegrias mais alegres e todas as tristezas mais tristes que experimentamos?

Aos cinquent’anos, hermanos, será que já não temos a calma reconfortante para saber esperar o futuro com paciência: como quem espera pelo sol ou como quem espera pela lua?

2 comentários:

Anônimo disse...

Seu filho manda;
1 Beijo
1 Abraço
e um não esqueça dela Ítallo Diniz Castro...

Itallo disse...

b